A II Expo Internacional da Consciência Negra aconteceu nos dias 18, 19 e 20 de novembro de 2022. Com mais de 18 mil visitantes, 74 estandes de empreendedoras e empreendedores pretos, palestras, shows e muito mais, o evento apresentou grandes nomes da literatura que debateram e conversaram sobre suas obras, levantando muitas reflexões sobre diversos assuntos.
Confira, agora, um resumo de cada um dos painéis do dia 18 de novembro. Para assistir completo, acesse o Facebook do Portal Áfricas.
Vamos lá?
Painel 1 – Sentidos de Liberdade: Independência, Abolição, Quilombismo
Apagamento. Essa foi a principal palavra do primeiro painel da II Expo, ocorrido no dia 18 de novembro. A mesa, composta por Flávio Gomes, historiador, Lília Schwarcz, também historiadora, com mediação de Tom Farias, escritor e curador da Expo, levanta assuntos importantes sobre “Sentidos de Liberdade: Independência, Abolição, Quilombismo”.
Durante o painel, os historiadores citam o apagamento da história do Brasil que envolve os quilombos, a abolição e como a independência foi e ainda é camuflada. Flávio conta que existem poucos registros, ou melhor, que a verdadeira história não chega com primazia. Um exemplo disso, segundo ele, foi que entre 1860 e 1869 houve 40 revoltas de escravos no Brasil e que todos esses acontecimentos são difíceis de conectar com a abolição, que ainda está muito associada a um debate parlamentar, branco e focado na figura da Princesa Isabel. Porém, se analisarmos os registros, muitos acontecimentos estão por trás disso.
A convidada e também historiadora, Lília Schwarcz, diz que a história é passada de uma forma e sua narrativa reproduzida se forma errônea. “Enxergar é uma opção cultural”. Afirmando a fala de Flávio, a palestrante relembra que nossos artigos são totalmente coloniais. A historiografia é masculina, assim como sudestina, sem a participação de movimentos sociais.
Para fechar o tema, os historiadores citam a falta de informações sobre a nossa história.
“‘Até o momento não sabemos’ essa é a frase que usamos nas nossas pesquisas. E a névoa do não sabemos significa o silêncio da memória.”, finaliza Lília.
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Painel 2 – Escrita negra e vida: que joelho é este que tanto as sufoca?
No segundo painel, “Escrita negra e vida: que joelho é este que tanto as sufoca?”, os convidados Cuti, poeta e ensaísta, Míriam Alves, poeta e romancista e Tom Farias, escritor debatem como o racismo provoca o sufocamento da produção literária e inibe o surgimento das novas gerações.
Durante a conversa, Cuti afirma que todas as pessoas, independentemente da cor e etnia, tiveram sua origem na África. E comenta que a escola ainda trabalha com a ideia subliminar de que cada fenótipo teve sua origem em um lugar. Mas o mapeamento genético mostra o oposto. “Todos nós somos descendentes africanos, e como o racista fica diante dessa situação?”, questiona.
Para o convidado, o racismo é fruto do contato. Quando se está sozinho, não há racismo, ele acontece quando há outra pessoa, no caso racista, que comete ato. “O racismo é algo de relação. É feito do contato entre pessoas diferentes. Então a nossa literatura recebe também o “joelho” porque ela está revelando algo que o racismo não quer que revele. A literatura vem desvendar não apenas a nossa subjetividade. A literatura negro-brasileira desvenda também a subjetividade de brancos, mestiços, etc.”, comenta Cuti.
Segundo o ensaísta, a branquitude é o lugar de privilégio pela brancura que o racismo possibilita. O texto que não desafia a hierarquia racial é muito mais bem aceito. Existem mais de 93 milhões de pessoas que nunca leram um livro na vida, e as que leram, chega em torno de 4,8 livros por ano.
Para fechar a conversa, a poeta e romancista Míriam Alves, complementa: “O joelho está no pescoço de pessoas negras de todos os países e nos negros porque somos desumanizados e descartados. Muitos dizem que a história não se julga, mas também não podemos glorificá-la. Somos ensinados que existem dois tipos de pessoas: as que podem bater e as que apanham, e as que apanham são vistas como heróis nacionais, conforme ensinado nas escolas.”Saiba mais sobre o assunto, assista à transmissão completa no Facebook do Portal Áfricas.
Painel 3 – Biografias Negras: Os retratos do Brasil
No terceiro painel da II Expo, os participantes Bianca Santana, biógrafa, Jeruse Romão, biógrafa e Oswaldo Faustino, jornalista e mediador, debateram sobre outro Brasil visto pelas lentes de pesquisadores e historiadores negros: como a vida de homens e mulheres negros impactaram na história do brasileiro contemporâneo.
No painel, Bianca fala sobre a vida de Sueli Carneiro, de como foi o seu processo de escrita do livro “Continuo preta: a vida de Sueli Carneiro”. Ela conta que essa trajetória toda ensinou que é possível ir em busca da nossa genealogia e que muitas vezes crescemos ouvindo que não existem documentos: “Onde existiu abolição, existiu também o registro nas igrejas, cartórios, fóruns e hospitais, que podemos usar ou não. Nossos documentos existem e estão esperando por nós”. Ou seja, como foi dito no primeiro painel, muitas vezes o apagamento da própria identidade negra se faz presente e que isso não deve ser um impedimento para buscar as próprias raízes. “Fui até os Estados Unidos e encontrei mais de 40 livros diferentes sobre genealogia negra”, finaliza.
Jeruse Romão, autora do livro “Antonieta de Barros: Professora, escritora, jornalista, primeira deputada catarinense e negra do Brasil”, conta que também foi preciso estudar a árvore genealógica de Antonieta. Por ser a única mulher negra dos eventos da época deixava muitos recados, um deles é que, segundo a autora, as mulheres não precisam ser “bibelôs”. Um dos capítulos do livro também fala sobre as pessoas negras do estado de Santa Catarina, época que vai de 1920 e 1940 e que, inclusive, tem-se registro de que as primeiras organizações do movimento negro.
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Painel 4 – Modernismos e Modernidades: Os Lima Barreto de hoje
No quarto painel, “Modernismos e Modernidades: Os Lima Barreto de hoje”, os convidados Paulo Lins, romancista e roteirista, Geovane Martins, escritor e Paulo Scott, mediador, conversam sobre a ideia de uma produção que não surja da elite e sim das camadas periféricas, num gatilho com produções e produtores culturais do passado, como Lima Barreto: hora de ouvir outras vozes dentro da ruptura do sistema estabelecido.
Ambos são escritores que, assim como Lima Barreto, escrevem e abrem reflexões contra o sistema. Paulo Lins, autor do livro “Cidade de Deus, sobre a vida nas favelas do Rio de Janeiro” fala sobre sua infância e como percebeu o racismo na pele quando começou os estudos na Universidade.
Ele comenta da importância dos antepassados, pessoas negras, para que tenham a liberdade e o lugar para escrever livremente. “Só de termos o direito de escrever e falar sobre racismo, é por conta de uma luta que vem sendo travada há séculos”. A conexão com o passado é fundamental, é através da arte no geral como a música, a dança, a literatura que perpetuamos e honramos a cultura afro-brasileira.
Muitas pessoas que publicam são afrodescendentes e isso há 20 anos era quase impossível, havia poucas pessoas negras publicadas e nem havia mídia. Ter essa base de autores é essencial para quem está começando. A conexão com o passado é fundamental, é através da arte no geral como a música, a dança, a literatura, perpetua a cultura.
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Painel 5 – Herdeiras Africanas: Histórias, vozes e literaturas
No quinto painel, a escritora moçambicana Paulina Chiziane compõe a mesa com Tom Farias, mediador.
A convidada nasceu em 1955, em Moçambique. Após publicar alguns contos na imprensa, estreou com “A balada de amor ao vento”, em 1990. Além de “Niketche”, é autora de “Ventos do Apocalipse”, “O sétimo juramento”, “O alegre canto da perdiz”, entre outros. Em 2021, venceu o prêmio Camões de literatura.
Estudou numa escola católica para negros. Uma mulher que começou a desenvolver o seu senso crítico desde muito nova. Paulina prefere ser chamada de contadora de histórias, segundo ela, assumir esse título é como “dar liberdade” para ditarem o que é certo ou errado num livro de romance, por exemplo. “Recuso o título de romancista porque vi pessoas querendo impor a sua autoridade, em cima da minha liberdade”, comentou.
Um dos principais temas que a escritora aborda no painel é sobre como a mulher é descrita na literatura, principalmente a mulher negra. Muitas vezes de forma desumanizada e outras hipersexualizada. “A escrita, a literatura tem de ser mais humanas. Como os homens nos tratam? Onde estavam as mulheres quando os textos do “livro sagrado” foram escritos? E se elas estivessem presentes, que textos elas teriam produzido?
Muitas vezes, o simples fato de uma mulher despertar, tomar um café ou realizar qualquer ação é visto como sexual e isso é retratado em muitos livros escritos por homens. Logo em seguida, a autora completa: “E se uma mulher “despe” um homem na literatura, logo afirmam ser pornografia”.
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